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quarta-feira, 22 de outubro de 2014

A Sinfonia


Jospeh Haydn compôs 104 sinfonias e é o inventor da sinfonia moderna.

C. N.


Origens e invenção

I. Comecemos por dar o étimo da palavra sinfonia: o lat. symphonìa, ae (ou seja, “harmonia de sons; grupo de músicos, de cantores, orquestra; depois, certo instrumento musical [viela ou sanfona, ancestral dos instrumentos de corda])” < gr. symphonía, as (ou seja, “concerto de várias vozes, ou de diversos instrumentos, concerto instrumental”). Entre o latim e o português, provavelmente serviu de intermediário o fr. symphonie, ou melhor, siphonie (entre 1120 e 1150).
II. Entre o fim do Renascimento e o início do Barroco, sinfonia era outro nome quer de canzona, quer de fantasia, quer de ricercar ou ricercarta, formas afins à tradição polifônica. Algum tempo depois, já em pleno Barroco, passou a denominar ou a sonata trio, ou certa sorte de sonata para numerosos instrumentos, ou ainda, depois, certo prelúdio de peças instrumentais.
III. Por outro lado, do século XVII ao XVIII, passou a chamar-se sinfonia a qualquer prelúdio, a qualquer interlúdio ou a qualquer poslúdio instrumentais de oratório ou de ópera, ou seja, quaisquer seções que contrastassem com as majoritárias seções vocais.
IV. Uma de tais seções instrumentais era a sinfonia em três movimentos de abertura da ópera italiana, o mais das vezes composta em ré maior para potencializar o efeito de júbilo entre o naipe de cordas. Os dois movimentos extremos eram de andamento rápido, e o central de andamento lento, como nas óperas de Alessandro Scarlatti (1660-1725).
V. Por outro lado, na França, a ouverture – isto é, a abertura francesa – era muito distinta da abertura italiana, e em certo sentido lhe era o oposto. Composta de um só movimento em a-b-a, contava com extremos de andamento lento e seção intermediária de andamento algo mais rápido. Esta foi a forma de abertura preferida de Georg Friedrich Händel (1685-1759), que porém a adaptou segundo seu gênio próprio.[1] Com efeito, a maioria das óperas e dos oratórios de Händel começa com uma ouverture, a que ele por vezes, porém, chama sinfonia – Sinfony –, como n’O Messias. Não obstante, Händel também empregou o prelúdio e o interlúdio orquestrais ao modo italiano; é o caso da Introduzione de Delirio amoroso, HWV 99.
VI. Enquanto isso, a sinfonia em estilo italiano, com três movimentos, começa a assemelhar-se ao concerto, ainda que, ao contrário deste, não conte com solista. Assim, por exemplo, em Antonio Lucio Vivaldi (1678-1741), cujas sinfonias-prelúdio de ópera efetivamente se aproximam de seus concertos.
VII. O caso de Johann Sebastian Bach (1685-1750) é mais complexo. Por vezes, valeu-se do nome sinfonia à antiga, ou seja, para denominar peças instrumentais de um só movimento, como as Invenções, BWV 787-801, polifônicas a três partes ou vozes (instrumentais). Por outro lado, se uma obra vocal sua começava com um ou mais movimentos instrumentais independentes, chamava-a ou sinfonia ou sonata, e compunha-a antes em estilo italiano que em estilo francês. Exemplos: a Sinfonia que abre duas de suas cantatas seculares (Non sa che sia dolore, BWV 209, e Mer Hahn en neue Obekeet, BWV 212) e a de abertura (seguida de adágio) do Oratório da Páscoa, BWV 249.
VIII. Ao longo século XVIII, todavia, por um lado, abertura foi-se firmando como o nome próprio do prelúdio instrumental de obra vocal ou operística, o qual, por sua vez, se firmava como forma antes assemelhada à abertura italiana, mas com caracteres próprios: motivo condutor, reexposição antecedida de algum desenvolvimento temático, clima de expectativa, ou seja, de irresolução. Mas, por outro, firmou-se a sinfonia italiana em três movimentos como composição orquestral independente, de que são exemplos as primeiras sinfonias de Joseph Haydn (1732-1809) e de Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791).[2]
IX. Sucede, porém, que o mesmo Haydn fez que a sinfonia italiana independente (a de concerto) e a abertura ou suíte ao modo francês se reencontrassem, para mesclá-las: aos três movimentos da sinfonia agregou um quarto, como terceiro movimento. Era o minueto, até então movimento próprio de suíte. Valeu-se, ademais, da forma sonata[3] de então (o que implicava, por exemplo, a possibilidade de começar em andamento lento o primeiro dos quatro movimentos da nova forma sinfônica).
Nascia a sinfonia moderna, a potencialmente mais bela e mais profunda das formas musicais não religiosas.




[1] Mas ouverture também passou a denominar o movimento introdutório de qualquer suíte, ou a mesma suíte, como é o caso das Aberturas em Estilo Francês ou Suítes Francesas, BWV 831, de Johann Sebastian Bach.
[2] Mozart também compôs divertimentos nos moldes da sinfonia italiana.
[3] Forma musical constituída de exposição, de desenvolvimento e de recapitulação, empregada a partir de Haydn no primeiro movimento não só de sonatas e de concertos, mas também de sinfonias. Também se diz sonata forma.

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