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O arrependimento de um grande artista



Carlos Nougué

Michelangelo, indubitavelmente um grandíssimo artista (que o diga sua Pietà), foi durante quase toda a vida, porém, um homem típico de seu tempo, o do mal chamado Renascimento, quando esse câncer da Cristandade que é o humanismo penetrou quase tudo (a política, o pensamento, a arte, etc.), chegando por vezes até à própria Cátedra de Pedro. Já então, se se excetuarem em boa parte as Espanhas, autêntica continuidade da Idade Média e propriamente chamadas Christianitas minor, a maior parte dos homens e suas atividades tendia a não ordenar-se a seu fim último e bem comum do universo, Deus, e portanto a esquivar-se da devida submissão ao poder espiritual da Igreja. No século XIII, tudo louvava a Deus; a partir do século XVI, quase tudo tendeu a louvar o homem, e, em meio a vaivéns e por vias não raro sinuosas, o câncer vai espalhar-se até a metástase atingir o ponto derradeiro com a “vitória” do humanismo dito católico na segunda metade do século XX.
Pois bem, como dizia, Michelangelo não escapou deste mal e suas conseqüências, quer na vida privada, quer na atividade artística: idolatria do homem e da própria arte, e libertinagem. Diferentemente, contudo, de um Leonardo da Vinci ou de um Botticelli, cujas obras são de um gnosticismo muito mais acentuado e de uma sensualidade ainda mais enfermiça que os de Michelangelo, este ao fim da vida se arrependeu de tudo quanto fizera. Sabemo-lo porque o diz o próprio artista, quer pelas obras dos últimos anos (nada sensuais), quer sobretudo por um tocante soneto. Com efeito, Michelangelo costumava compor poemas para descrever cada fase de sua carreira, e não o deixou de fazer para refletir a última. E entre os poemas desta está o referido soneto, que se lê abaixo (primeiro na língua original, e em seguida em antiga tradução literária de minha lavra):

Giunto è già ’l corso della vita mia
Con tempestoso mar per fragil barca,
Al comun porto, ov’ a render si varca
Conto e ragion d’ogni opra triste e pia.

Onde l’affetuosa fantasia
Che l’arte mi fece idol’e monarca
Conosco or ben, com’ era d’error carca
E quel ch’a mal suo grado ogn’ uom desia.

Gli amorosi pensier, già vani e lieti,
Che fien or s’a duo morte s’avvicino?
Da uno so ’l certo, e l’altra mi minaccia.

Nè pinger nè scolpir fie più che quieti
L’anima, volta a quell’ amor divino,
Ch’aperse, a prender noi, ’n croce le braccia.

Tradução

Já atinge o curso desta vida minha
Com tempestuoso mar por frágil barca
O comum porto, aquele a que se atraca
Por prestar contas de obra triste ou pia.

Ora a tão afetuosa fantasia
Que me fez da arte ídolo e monarca
Eu já sei contra que faz sua carga:
O que, malgrado seu, o homem ansia*.

E os tão ligeiros e mui vãos transportes
De outrora, já perante as duas mortes?**
De uma estou certo, da outra me amofino.

Já nem estátua ou fresco*** me conduz
À paz da alma, só o amor divino,
Que a nós mui largo abraço abriu na cruz.



* “anseia”, em sua forma antiga.
** A morte do corpo, e a morte da alma condenada ao inferno.
*** afresco.

Jacobus Gallus - Opus musicum


00:00 - In adventu domini nostri Jesu Christi - Venite ascendamus a 8
03:12 - In adventu domini nostri Jesu Christi - Obsecro Domine a 4
05:19 - De nativitate circumcisione et epiphania domini - Tribus miraculis a 12
08:08 - De nativitate circumcisione et epiphania domini - Mirabile misterium a 5
11:41 - De nativitate circumcisione et epiphania domini - Ab Oriente venerunt magi a 4
13:55 - Ad dominicae septuagesimae per quadragesimam - Pater noster a 8
17:26 - Ad dominicae septuagesimae per quadragesimam - Lamentatur Jacob a 6
24:00 - Ad dominicae septuagesimae per quadragesimam - Eripe me a 5
28:32 - Ad dominicae septuagesimae per quadragesimam - Versa est in luctum cithara mea a 5
32:10 - De resurrectione et ascensione domini nostri Jesu Christi - Quo mihi crude dolor a 8
35:54 - De sancta Trinitate et de Corpore Christi - O beata Trinitas a 8
38:24 - In dedicatione templi et a dominica post pentecostem usque ad adventum Domini - Planxit David a 8
42:43 - In dedicatione templi et a dominica post pentecostem usque ad adventum Domini - Jesu dulcis memoria
46:10 - In dedicatione templi et a dominica post pentecostem usque ad adventum Domini - Domine Deus exaudi orationem a 16

Chansons de la Renaissance (Ensemble Clément Janequin)

Chansons de la
Renaissance



1. Qu'est-ce d'amour? by Clément Janequin 0:00

2. Une bergère un jour by Nicolas de Marle 
2:37

3. Tant que vivray by Claudin de Sermisy 
4:15

4. Le content est riche by Claudin de Sermisy 
6:34

5. Il est bel et bon by Pierre Passereau 
8:32

6. Gaillarde pour luth by Guillaume Morlaye 
9:52

7. Un gay berger by Thomas Crecquillon 
11:25

8. Petite fleur coincte et jolye by Thomas
Crecquillon 
12:48

9. Comment au départir by Pierre Clereau 
14:14

10. Fantasie pour luth No.10 by Guillaume Morlaye 
18:37

11. En m'en venant de veoir by Clément Janequin 
20:30

12. Fricassée by Crespel (XVIe siècle) 
21:57

13. La prise de Calais (Hardis Françoys) by
Guillaume Costeley 
23:41

14. Doulce mémoire by Pierre Sandrin 
27:38

15. Finy le bien (Response de ' Doulce mémoire ')
by Pierre Certon 
30:28

16. Elle craint l'esperon by Guillaume Costeley 
33:05

17. Fricassee (Anonym)(Attaingnant, 1531) 
36:47

18. Dieu qui conduictz - Echo by Gentian 
38:57

19. Je suis Robert by Gentian 
41:07

20. D'amours me plains d'après Rogier Pathie by
Albert De Rippe 
42:55

21. A ce matin by Delafont 
45:29

22. Las, je m'y plains by Claudin de Sermisy 
47:27

23. Ung jour Robin by Clément Janequin 
49:43

24. Mon amy m'avoit promis by Ninot le Petit 
51:58

G.P. da Palestrina: Missarum Liber Primus


MISSARUM LIBER PRIMUS
[Primo Libro delle messe, 1554]

MISSA Ecce Sacerdos magnus 
1. Kyrie 0:01
2. Gloria 4:08
3. Credo 10:14
4. Sanctus 20:30
5. Agnus Dei I & II 28:18

MISSA O Regem cœli
1. Kyrie 34:37
2. Gloria 38:30
3. Credo 44:24
4. Sanctus 54:13
5. Agnus Dei I & II 1:00:00

MISSA Virtute magna
1. Kyrie 1:04:29
2. Gloria 1:08:55
3. Credo 1:15:00
4. Sanctus 1:25:07
5. Agnus Dei I & II 1:33:25

MISSA Gabriel Archangelus
1. Kyrie 1:38:21
2. Gloria 1:42:41
3. Credo 1:49:11
4. Sanctus 1:58:25
5. Agnus Dei I & II 2:06:49

MISSA Ad cœnam Agni providi
1. Kyrie 2:11:31
2. Gloria 2:15:30
3. Credo 2:22:07
4. Sanctus 2:33:18
5. Agnus Dei I & II 2:41:02

Solisti e Coro della Radiotelevisione Svizzera
Diego Fasolis [direction]

Bruckner - Te Deum


Disse Anton Bruckner: “Quando o bom Deus me chamar para prestar-lhe contas do uso que fiz de minha vida na Terra, eu lhe mostrarei a partitura de meu Te Deum, e ele há de julgar-me com misericórdia”. E escreveu Otto Maria Carpeaux: “O céu parece abrir-se para recebê-lo em seus braços misericordiosos quando ouvimos esse trecho máximo [de seu Te Deum] que é o Non confundar in aeternum”.


quarta-feira, 23 de novembro de 2016

The Best of Tallis


0:00 O Sacrum Convivium
4:52 Audivi Vocem
8:47 Lamentations (Set 1)
17:14 Discomfort Them, Oh Lord
23:52 Loquebantur Variis Linguis
27:39 Lamentations (Set 2)
40:18 Videte Miraculum
53:39 Mass For Four Voices - Sanctus
56:33 Call & Cry To Thee, O Lord
1:00:42 Salvator Mundi
1:04:42 Spem In Allium


Anton Bruckner - 6 Obras Corais


Carlos Nougué

Sem propriamente romper com a tradição germano-austríaca de cantatas e de corais religiosos (Bach, Mozart e outros), Bruckner, no entanto, vai dar a suas peças corais caráter estritamente católico e litúrgico. Não falo de suas missas, duas das quais ao menos, apesar de sua grande beleza e de sua profunda religiosidade, dificilmente têm caráter litúrgico. Falo tanto de suas peças mais propriamente litúrgicas (Tantum ergo, Graduale, Offertorium) como de suas peças devotas soltas (motetos, ave-marias, etc.), as quais ocuparam o compositor durante boa parte de sua vida (de 1845 a 1892, em S. Florian, em Linz, em Viena). Mas, mais que dar caráter estritamente católico e litúrgico à referida tradição germano-austríaca, Bruckner, mediante, como alguém já disse, uma elaboração harmônica finamente equilibrada (trate-se de vozes a capella ou, mais raramente, acompanhadas de trombones ou de órgão) e impressionante efeito de volume no uso das massas sonoras – o que evoca a grandiosidade das naves das catedrais góticas ou barrocas –, Bruckner como que retornará não só a um Allegri, mas, de algum modo, a Pérotin e Léonin (sem que conhecesse a música destes). Isso sem perder o caráter extático e ascendente – barroco – que bebeu desde tenra idade na igreja do mosteiro agostiniano de S. Florian, onde está sepultado perto de seu amado órgão. E, com efeito, escutar estas peças de Bruckner é sentir-se partícipe da devoção da multidão reunida naquela casa de Deus, em cujas rendilhas e volutas de pedra e de argamassa como que está tecida a fé de todo o povo cristão.
Em verdade, a música de Bruckner – seja a litúrgica, seja a profana (religiosa ou não) – é única. É ela mesma um cânon, um sublime cânon.

* * *
1. Ave Maria 
2. Afferentur regi 3:36
3. Pange lingua 5:10
4. Locus iste 9:56
5. O justi 13:08
6. Christus factus est 17:23

Anton Bruckner e Santo Tomás de Aquino: "Pange Lingua"


Carlos Nougué

Disse Pio XI que a Suma Teológica de Santo Tomás de Aquino é o Céu visto da Terra. E este sublime hino religioso é o Céu poetizado e cantado da Terra. Que eu não perca um dia de vida sem que louve e divulgue estes dois cumes da humanidade: Santo Tomás de Aquino e Anton Bruckner. 



quarta-feira, 9 de novembro de 2016

A partir das 13 horas de hoje (10/11/2016), já se poderão fazer as inscrições para o novo curso de Carlos Nougué: “História da Música Erudita Ocidental (litúrgica e profana)”


História da Música Erudita Ocidental
(litúrgica e profana)

Curso on-line de 24 horas ministrado por 
Carlos Nougué

[Curso já ministrado presencialmente e fundado
em nosso livro Das Artes do Belo, por publicar.]


“A música não tem por fim senão louvar a Deus e recrear a alma
(dentro de justos limites). Quando se perde isso de vista, já não pode haver
verdadeira música, e não restarão senão barulhos e gritos infernais.”
Joahnn Sebastian Bach


[Comunicado 1]


ABERTURA DAS INSCRIÇÕES PARA O CURSO 
E INÍCIO DESTE

1) Às 13 horas de 10 de novembro de 2016, abrir-se-ão as inscrições para o curso online História da Música Erudita Ocidental (religiosa e profana), de 18 horas, divididas em 12 aulas de cerca de uma hora e meia cada uma. 
2) As inscrições far-se-ão em nosso site:

VALOR E FORMAS DE PAGAMENTO

1) Valor total:
a) ou R$ 180,00 em até 6 parcelas sem juros no cartão de crédito;
b) ou R$ 165,30 por pagamento à vista mediante débito on-line ou boleto bancário.
Observação. O pagamento se fará, em nosso próprio site, mediante o PagSeguro.
2) Ao pagarem, os alunos-subscritores receberão automaticamente uma senha de acesso aos vídeos-aula e à bibliografia.

INÍCIO E DURAÇÃO DO CURSO 

1) O curso terá início neste mesmo dia 10 de novembro de 2016.
2) Num primeiro momento, serão liberadas duas aulas por semana. Depois de liberadas as doze, permanecerão.
3) Os alunos-subscritores terão acesso aos vídeos-aula durante um ano a contar da data de inscrição.

EMENTA DO CURSO

I. Fundamentos teóricos: a essência e o fim da Música, uma das artes do belo; fundamentos da teoria musical.
II. Os gêneros da Música:
1. Litúrgico;
2. Profano, que se subdivide em
a. Profano religioso;
b. Profano em sentido estrito.
III. Marcos da música litúrgica:
1. Canto ambrosiano (ou milanês);
2. Canto velho-romano;
3. Canto beneventiano;
4. Canto moçárabe;
5. Canto gregoriano;
6. Canto polifônico palestriniano.
 Compositores que serão tratados:
• Giovanni Pierluigi da Palestrina; Tomás Luis de Victoria; Gregorio Allegri.
IV. Marcos da música profana:
1. Origem.
2. A música profana medieval.
3. A música profana humanista e renascentista (do século XIV ao XVII).
 Compositores que serão tratados:
 Guillaume de Machaut; John Dunstable; Guillaume de Dufay; Johannes Ockeghem; Josquin Desprez; Jacob Obrecht; John Taverner; Thomas Tallis; Orlandus Lassus; William Byrd; Giovanni Gabrieli; Carlo Gesualdo; Jan Pieterszoon Sweelinck.
4. A música barroca (do século XVII ao XVIII).
 Compositores que serão tratados:
 Claudio Monteverdi; Orlando Gibbons; Girolamo Frescobaldi; Jean-Baptiste Lully; Dietrich Buxtehude; Marc-Antoine Charpentier; Johann Pachelbel; Arcangelo Corelli; Henry Purcell; François Couperin; Alessandro Marcello; Tomaso Giovanni Albinoni; Antonio Vivaldi; Georg Philipp Telemann; Jean Philippe Rameau; Georg Friedrich Haendel; Johann Sebastian Bach. 
5. A música clássica (do século XVIII a inícios do XIX).
 Compositores que serão tratados:
• Christoph Willibald Gluck; Carl Phillip Emanuel Bach; Franz Joseph Haydn; Wolfgang Amadeus Mozart; Ludwig van Beethoven.
6. A música romântica (do século XIX a meados do XX).
 Compositores deste período que serão tratados:
 Nicolò Paganini; Franz Schubert; Hector Berlioz; Felix Mendelssohn; Frédéric Chopin; Robert Schumann; Franz Liszt; Richard Wagner; César Auguste Franck; Anton Bruckner; Johannes Brahms; Piotr Ilich Tchaikovsky; Antonín Dvórak; Charles Marie Widor; Gabriel Fauré; Gustav Mahler; Claude Debussy; Jean Sibelius; Sergei Rachmaninoff; Franz Schmidt; Richard Wetz.
7. A música moderna ou atonal (século XX-XXI).
8. A música moderna tonal.
 Compositores que serão tratados:
 Philip Glass; Arvo Pärt.
• O caso de Prokofiev e de Shostakovich.
Apêndice: A Orquestra Moderna.
Observação 1: em cada aula se darão links para a audição ou assistência de peças dos diversos compositores tratados, além de indicações discográficas e técnicas (em PDF). Tanto aquelas peças como estas indicações estarão publicadas também em nossa página A Boa Música (www.aboamusica.com.br).
Observação 2: os alunos poderão sempre escrever ao professor suas dúvidas ou perguntas; e as respostas do professor ficarão disponíveis a todos os alunos.

CURRÍCULO DE CARLOS NOUGUÉ

I. Dados pessoais:
Nome: Carlos (Augusto Ancêde) Nougué;
Nacionalidade: brasileira;
Idade: 64 anos.
II. Qualificações profissionais:
1) Professor de Filosofia, de Teologia e de Estética por diversos lugares;
2) Professor de Tradução e de Língua Portuguesa em nível de pós-graduação;
3) Tradutor de Filosofia, de Teologia e de Literatura (do latim, do francês, etc.);
4) Lexicógrafo.
III. Autor dos seguintes livros:
• Suma Gramatical da Língua Portuguesa – Gramática Geral e Avançada (São Paulo, É Realizações, 2015, 608 pp.);
• Estudos Tomistas – Opúsculos (Formosa, Edições Santo Tomás, 2016, 192 pp.);
• Comentário à Isagoge de Porfírio (Formosa, Edições Santo Tomás; por lançar-se ainda em 2016);
• Das Artes do Belo (São Paulo, É Realizações; por lançar-se);
• A Necessidade da Física Geral Aristotélica (São Paulo, É Realizações; por lançar-se como estudo introdutório da tradução do Comentário de Santo Tomás à Física de Aristóteles).
• etc.
IV. Outros cursos on-line ministrados por Carlos Nougué:
V. Responsável pelas seguintes páginas web:
• Estudos Tomistas (www.estudostomistas.com.br);
• A Boa Música (www.aboamusica.com.br).

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Uma iniciativa conjunta
Central de Cursos Contemplatio
Associação Cultural Santo Tomás